Apontou o filho, como se entregasse criminoso na esquadra. O médico levantou os olhos, por cima das lentes, com o esforço de alpinista em topo de montanha.
- Há antecedentes na família?
- Desculpe, doutor?
O médico destrocou-se em tintins. Dona Serafina respondeu que não. O pai da criança, mecânico de nascença e preguiçoso por destino, nunca espreitara uma página. Lia motores, interpretava chaparias. Tratava-a bem, nunca lhe batera, mas a doçura mais requintada que conseguira tinha sido em noite de núpcias:
- Serafina, você hoje cheira a óleo Castrol.
O Fio das Missangas, Mia Couto
2 comentários:
Este excerto é de uma ternura, de uma pureza!
Pois é!!! Este livro de contos é, todo ele, uma delícia.
Em dia de aniversário, há 5 anos, recebi da minha filha, como presente, este livro, com a seguinte dedicatória:
«Mãe,... também a vida é como um colar de missangas em que vamos somando, todos os anos, diferentes contas (missangas) das mais diversas cores e formas. Que continues a colorir o teu colar de missangas, cada vez com contas mais brilhantes.»
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