
volto à infância: aos tamarinos

ácidos como os frutos
proibidos, aos cajus
polpudos,
às mangas vermelhas como o sol
aos filmes do Zorro
no São Domingos, à quitaba
e ao bombó assado,
enchendo de felicidade o
estômago
ao espadachim de mentira,
com improvisados floretes retirados
às construções,
à caçambula, atreza
−NINGUÉM! NINGUÉM!−
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Com estes elementos:
a) Mangas furtadas sobre o sol;
b) Uma vara de romãzeira;
c) Insensatas disputas de espadachim;
d) Uma cabeça coberta docemente de sangue;
e) Alguns jogos – a semalha, a besta quadrada, etc.;
f) Periódicas desinterias inexplicáveis; e
g) A colossal imagem materna,
Faço uma composição talvez esotérica e cujo profundo ordenamento e sentido – para além de alguns esteriótipos poéticos – desconheço. A infância – penso – é uma série exaltada de fragmentos singelos, os quais, entretanto, e apesar de misteriosamente inúteis, se revelam, à medida que se degrada o tempo, cada vez mais imperativos e estranhamente iluminados.
Ainda hoje o sape-sape
Sempre me sabe à
Memória do meu avô
Ao comê-lo, um nó
Endurece-me a garaganta
Esse sabor-espólio
Da árvore de sape-sapes
Que ele tanto amou
João Melo “Auto-retrato”