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quarta-feira, maio 07, 2008

Coisas que nem sei bem o quê

Ainda há bocado olhei para uma folha. Realmente as folhas são um bocado privilegiadas. Não têm que fazer nada, mas têm acesso a tudo. A todos os olhares e a todas as conversas, presenciam todas as situações e todas as confusões. O que não saberá uma folha! Certamente saberá que o Valente já está farto de trabalhar na oficina e que a Frederica não gosta do cão do marido, porque é alérgica ao seu pelo. Azar. Tenho a certeza que a folha ouve e vê todos estes arranhões da vida e diz “azar.” E não tem razão? No final, a única coisa que a folha tem que fazer é esperar por um rasgo de vento para poder seguir o seu caminho. E a partir daí se verá. Para onde irá a folha? Cada vez mais tenho a certeza que a folha diz “azar”.

O problema da folha é que por ser folha não pode folhear por aí e por aqui. E não folhear não tem piada. Mas o que chateia a folha, é que ela sabe que as pessoas podem folhear e não querem, só querem que o vento chegue, para saber como é o fim da história. Não, eu tenho a certeza que a folha aproveita a viagem toda, de outro modo, porque estaria ela ali? Para servir de confidente natural da agitação social? Não, nunca. Ao menos a folha desfruta do ramo, do vento e da poluição. A folha lida bem com tudo. Nunca está triste, zangada, magoada ou chateada. A folha não tem disposição, tem esta que tem e pronto. Se ao menos as pessoas fossem mais como as folhas. Se fossem como as folhas não lhes tinhamos que dizer nada. Cresciam e pronto, ficavam como a folha, aberta e disposta. Mas se assim o fosse seriam pessoas, porque passavam ao lado da viagem, e as pessoas fazem sempre a viagem, só não percebem que a estão a fazer.

Há coisas que não te sei explicar. Sim, é mais ou menos isso, mas agora tens que agir desse modo e não apenas falar. Essa é a diferença entre nós. Não, não, não em tudo, mas em várias coisas. Tu sabes bem que é assim. Tens que ser tão complicada porquê? Não percebo. Sim, claro, o eterno cliché feminista. Ah pois! Agora sou eu que sou machista. Não, eu só defendo o uso da lógica. Mas podes ao menos ouvir-me? Não te percebo. Nem vou perceber. Nem quero perceber. E não quero partilhar a minha viagem.


Vasco


3 comentários:

dinamene disse...

Olá! Gostei do blog das “palavras de bolso” e do improviso da escrita! Normalmente as palavras e a escrita saem assim a quem escreve por gosto…. De rompante, imprevisíveis, como se tivessem vida própria!.... Como se pegassem em nós e nos pusessem a escrever freneticamente, por necessidade!
Acho que olhaste para a folha, que olhou para ti…. Escreves com muita emoção apesar de defenderes a lógica!

solange disse...

Olá, Vasco! Adoro o teu jogo de palavras, em que se percebe a tua escrita sentida e crítica. Que orgulho ter sido tua professora e poder ler hoje este texto real e metafórico. Mais real ou mais metafórico?! A riqueza das palavras está precisamente nessa sua ambiguidade. Podem esconder a verdade e, ao mesmo tempo, ser tão directas a dizê-la. Continua a escrever e a LER!!!

didium disse...

Pois é filho, continua a escrever. Sinto-me orgulhosa quando te leio!
E pensar como cresceste!
Bjs