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sexta-feira, janeiro 02, 2009

Já há uns anos, num bar, ouvi um conto que me tocou muito, narrado por um Contador de Histórias, e com muita pena minha não o encontrei escrito em lado nenhum…Por isso, passo a resumi-lo, por palavras minhas:
Uma vez um viajante dirigia-se a uma pequena Vila que queria visitar, mas antes parou no cemitério que se situava a uns metros desta… Acreditava que para conhecer bem os vivos deveria também conhecer a forma como tratavam os seus mortos…
Para seu espanto, ao olhar as lápides, todas tinham um número de anos reduzido…
José Manuel Paiva, 2 Anos,
Deolinda Silva, 7 anos,
Maria Rodrigues, 5 anos,
… 4 anos,
… 10 anos,
…3 anos…
Perante isto, o homem começou a chorar até que alguém o interpelou:
- Porque chora? Tem aqui alguém conhecido?
- O que aconteceu aqui? Que desgraça?!!! Como há tantas crianças mortas?
- Ah! É isso?!... Pois na nossa Vila temos todos um caderno, desde o momento do nosso nascimento, onde apenas são apontados os momentos felizes que vivemos e quanto duram….
As primeiras palavras, 17 minutos.
Os primeiros passos… 7 minutos.
O primeiro beijo… 1 minuto.
O nascimento do primeiro filho… 1 hora e 30 minutos.
Um livro… 2 horas.
Uma música… 15 minutos.
Um jantar especial… 3 horas.
….
E, no dia em que morremos, é feita a soma de todos os minutos e horas felizes que vivemos e inscrita na lápide.
Porque acreditamos que o que realmente importa é aquilo que de bom sentimos, partilhamos e vivemos enquanto seres humanos que somos.

2 comentários:

solange disse...

Minha querida, este conto é especial e leva-nos à reflexão do que é viver. E está escrito, podendo ser lido em «Contos para pensar» de Jorge bucay.
Também não foi ele que o inventou, alguém lho contou e ele registou-o, dando-lhe o título de "O pesquisador".
Eu tenho o livro e o conto, mas não vou escrevê-lo, pois a minha pesquisa levou-me a uma ficha de Filosofia, do 11º ano, em que se questiona "O que é viver?".
Por isso, aí vai, tim-tim por tim-tim. Foi óptimo teres-te lembrado deste conto.
«Esta é a história de um homem a quem eu definiria como um pesquisador.

Um pesquisador é alguém que busca; não necessariamente alguém que encontra.

Tão-pouco é alguém que, necessariamente, saiba o que anda a buscar. É simplesmente alguém para quem a vida é uma busca.

Um dia, o pesquisador sentiu que devia ir até à cidade de Kamir. Tinha aprendido a respeitar rigorosamente aquelas sensações que vi­nham de um lugar desconhecido. Por isso deixou tudo e partiu.

Depois de dois dias de marcha pelos caminhos empoeirados, avis­tou, ao longe, Kamir. Um pouco antes de chegar à povoação, cha­mou-lhe vivamente a atenção uma colina à direita da azinhaga. Estava atapetada de um verde maravilhoso e tinha uma grande quantidade de árvores, pássaros e flores encantadoras. Estava inteiramente rodeado­ por um pequeno muro de madeira brilhante.

Uma portazinha de bronze convidava-o a entrar.

Sentiu logo que o povoado lhe fugia da memória e sucumbiu à tentação de descansar por um momento naquele lugar.

O pesquisador ultrapassou o portal e começou a caminhar lenta­mente por entre as pedras brancas que estavam dispostas ao acaso entre as árvores.

Deixou que os seus olhos se pousassem como borboletas em cada pormenor daquele paraíso multicolor.

Os seus olhos eram os de um pesquisador, e foi talvez por isso que descobriu aquela inscrição sobre uma das pedras:



Abdul Tareg, viveu 8 anos, 5 meses, 2 semanas e 3 dias.



Ficou um pouco surpreendido ao dar-se conta de que aquela pedra não era simplesmente uma pedra: era uma lápide.

Sentiu pena ao pensar que um menino de tão tenra idade estava enterrado naquele lugar.

Olhando à sua volta, o homem deu-se conta de que a pedra ao lado também tinha uma inscrição. Aproximou-se para a ler. Dizia:



Yamir Kalib, viveu 5 anos, 8 meses e 3 semanas.



O pesquisador sentiu-se terrivelmente comovido.

Aquele lindo lugar era um cemitério, e cada pedra era uma campa. Começou a ler as lápides uma por uma.

Todas tinham inscrições semelhantes: um nome e o tempo exacto de vida do morto.

Mas o que o enleou de espanto foi comprovar que aquele que tinha vivido mais tempo mal ultrapassava os onze anos... Paralisado por uma dor terrível, sentou-se e pôs-se a chorar.

O encarregado do cemitério passava por ali e aproximou-se.

Observou-o a chorar durante algum tempo em silêncio e perguntou-lhe se chorava por algum familiar.

- Não, não é por nenhum familiar - disse o pesquisador. - Que se passa nesta povoação? Que coisa tão terrível acontece nesta cidade? Porque é que há tantas crianças mortas enterradas neste lugar? Qual é a maldição horrível que pesa sobre estas pessoas, que as obrigou a construir um cemitério de crianças?

O ancião sorriu e disse:

-O senhor pode tranquilizar-se. Não existe uma tal maldição. O que acontece é que temos um costume antigo. Vou-lho contar:

«Quando um jovem completa quinze anos, os seus pais oferecem­-lhe um livrete como este que tenho aqui, para que o pendure ao pescoço. É tradição entre nós que, a partir desse momento, de cada vez que alguém desfrute intensamente de alguma coisa, abra o livrete e anote nele:



À esquerda, o que foi desfrutado.

A direita, quanto tempo durou o prazer.



Conheceu a sua noiva e enamorou-se dela. Quanto tempo durou essa paixão enorme e o prazer de a conhecer? Uma semana? Duas? Três semanas e meia...?

E depois, a emoção do primeiro beijo, o prazer maravilhoso do primeiro beijo... Quanto durou? O minuto e meio do beijo? Dois dias? Uma semana?

E a gestação e o nascimento do primeiro filho...? E as bodas dos amigos?

E a viagem mais desejada?

E o encontro com o irmão que regressa de um país longínquo?

Quanto tempo durou o desfrutar destas situações?

Horas? Dias?

Assim, vamos anotando no livrete cada momento que desfrutamos… Cada momento.

Quando alguém morre é nosso costume abrir o seu livrete e somar o tempo em que sentiu prazer, para o escrever sobre a sua campa.

Porque é esse quanto a nós o único e verdadeiro TEMPO VIVIDO.»

Jorge Bucay, Contos para pensar.

dinamene disse...

Maravilhoso conto de J. Bucay. Suponho que foi exactamente a versão que ouvi do contador de histórias.... Claro que já não me lembrava de certos pormenores.
Gostei de o ler.