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sábado, janeiro 31, 2009
Cortar o tempo
sexta-feira, janeiro 30, 2009
Meio-dia
terça-feira, janeiro 27, 2009
Coisas que se pensam quando qualquer outra coisa seria menos inútil
Ele traduz uma palavra com cuidados de mãe, por uma outra que ele sabe, mas não eu.
Levaria o resto da vida para perceber onde põe ele as cores numa cidade, se lhe é pedido que a preencha de tons.
É por isso que não lhe entendo as palavras, mesmo que já destrocadas cada vez mais em significados mais simples e prefiro pensar, que se em vez da cidade como exercício para eu lhe compreender as palavras originais, esta passasse a ser um corpo de mulher, eu já conseguiria ler-lhe nos lábios o entendimento que tem do mundo, porque então eu seria essa rua grande cheia de ruas, que receberia as cores.
O percurso
percorria vias livres
e interditas,
espreitava os atalhos, os becos,
regressava descontente,
pelas palavras não ditas,
de imagens ainda em mente,
de episódios mal contados, mal vividos,
nas histórias acontecidas.
E, prosseguia nessa inglória,
à procura de razões, de justificações.
Essas, foram omitidas,
caladas, consentidas.
Válidas, na altura,
se ditas, explicadas, admitidas!
E o pensamento parou
no silêncio do agora,
despiu-se de preconceitos,
vestiu-se de resignação.
Alterar o vivido?
Inquestionável, fora de controlo,
inalterável.
Prosseguir o momento,
dar-lhe futuro
e, mesmo nos atalhos,
descobrir consciente
a dualidade do viver,
no passado e no presente,
não podendo ser omnipresente,
nem mesmo omnisciente!
maria eduarda
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domingo, janeiro 25, 2009
A visita
foto:G.Ludovice
A VISITA
Doce e aflita, para desandar com os mosquitos da injustiça, pousa-lhe devagar junto onde descansa a cabeça bem trançada, no absoluto quase escuro da noite, um pequeno prato com guloseimas em jeito de biscoitos.
A mulher negra arqueia-se em curiosidade e pergunta-lhe, para que quer ela que ela coma na hora da sombra maior, e a mulher branca só resmunga algo, num furor amansado de pergunta que cresceu junto ao corpo.
Onde estavas, que não brincaste comigo? Esperei muito no meu quarto largo, em tardes que se esticavam, enredada em brinquedos só para mim. Por que razão não vieste? Eu tanto queria fazer contigo as bonecas, que eram por ti começadas pelo enchimento de umas tiras de panos, com pano, até se formar mais acima aquela barriga e logo os braços, depois a cabeça no desafio final, com os olhos tesourados também em pano, cosicados no pano do rosto. Duravam menos que as loiras, que apesar de resistentes, já só chegavam se por acaso ao teu bairro, em estado de vítimas de abusada guerra, mutiladas de membros, zarolhas no seu azul de olhos de abrir e fechar, com a cabeleira amadoramente recortada, meias esfarrapadas a precisarem dos teus panos coloridos nos seus troncos cor-de-rosa já esfolados, sem nome nem aquele cheiro de loja, mas com aquele perfume dos usos.Eram tão oxigenadas de natureza, que até para mim se tornava complicado criar uma árvore genealógica, em que elas pudessem ser minhas filhas.
Um dia trouxe nas minhas elaborações femininas, um alemão bem loiro que vivia num submarino num filme de guerra e passou a ser o pai delas.
Todos os natais lá vinham, com mais uma nórdica deslavada importada para os trópicos e que por destino fácil de explicar, ia parar não à tua, mas à minha árvore ainda com pistas de resina, vestida ricamente de verdes agulhas, de onde pendiam ora anjos, ora sinos e bolas, onde me podia espreitar em deformação nas suas curvaturas brilhantes.Dos teus anseios, nada me chegou inteiro.
Em que musseque saltitavas com os miúdos da mesma pobreza, por entre as poças de água da chuva, que não te pude oferecer nem uma nova boneca loira, ainda de pestanejo móvel em condições, com que inventava sozinha lares na minha casa grande?
Haveríamos juntas de arranjar uma solução para que fossem tuas filhas também, como as tuas nascidas de pano, minha descendência.
Na minha casa existiam janelas de vidro do tamanho de paredes inteiras, mas nunca te vi passar sempre que me empoleirei para cheirar o mundo e, por isso, só me visitavas a imaginação através dos sons nocturnos dos tambores em noites de festa.Agora temos de pôr no pano do coração, os mimos que não destrocámos na meninice.
A mulher negra fica só de olhos cogitantes, suspensa na delícia de outra bolacha enchapelada de creme, no exagero da branca já de carunchos como ela, a querer não perder mais do que já perdeu. 2007
sábado, janeiro 24, 2009
Ser Angolano
A Barbie do Cuíto
José Eduardo Agualusa
«A vida num sopro» de José R. dos Santos
Luís é um estudante idealista que se cruza no liceu de Bragança com os olhos cor de mel de Amélia. O amor entre os dois vai, porém, ser duramente posto à prova por três acontecimentos que os ultrapassam: a oposição da mãe da rapariga, um assassinato inesperado e a guerra civil de Espanha.
Através da história de uma paixão que desafia os valores tradicionais do Portugal conservador, este fascinante romance transporta-nos ao fogo dos anos em que se forjou o Estado Novo.
Com A Vida Num Sopro, José Rodrigues dos Santos confirma a sua mestria e o lugar que já ocupa nas letras portuguesas.”
Meninices
tive um motorista de táxi,
um miúdo alegre, brincalhão,
que me chamava, por vezes,
para as brincadeiras de então.
A tampa de uma panela,
um guiador de automóvel,
o chão do pátio, o assento,
a sua voz, no intento,
do ruído da viatura,
a estacionar,
ou em movimento.
Eu pedia permissão,
indicava o destino,
e atento,
o meu motorista
sem hesitação,
levava-me ao mundo da fantasia,
à viagem da ilusão.
Incluía-me ele, nessa tropelia,
nessa felicidade,
em crianças em idade,
felizes, no seio da família.
Nossa mãe passava,
na sua azáfama diária,
e um sorriso lançava
aos filhos em harmonia.
maria eduarda
sexta-feira, janeiro 23, 2009
O "Diário" de Sebastião da Gama tem 60 anos
Houve nesta conversa uma palavra para guardar tanto como as outras, mais que todas as outras: "O que eu quero principalmente é que vivam felizes".»
quinta-feira, janeiro 22, 2009
quarta-feira, janeiro 21, 2009
Coisas que se pensam quando qualquer outra coisa seria menos inútil,
Fazer sentido
se traduzir num mapa,
recheado de linhas,
quero saber-te aqui,
e, olhando-me, conheceres
nas linhas minhas,
o caminho percorrido,
o atalho escolhido,
as regras transgredidas,
e o amor por ti sentido.
Quero que a ternura impere,
cimentada em uníssono,
neste nosso caminhar,
na luta par a par,
travada contra tempos,
que não nos davam vitória!
Quero olhar para ti e,
em cada linha do rosto teu,
ver reflectido um esboço meu,
da viagem percorrida, unida,
sempre,sem despedida!
Só assim a luta faz sentido,
porque assim foi nosso, o vivido!
maria.eduarda
O percurso do estar feliz, estadia em movimento?
E a verdade é que apenas sou feliz quando estou sentado no carro entre o lugar que acabei de deixar e o outro para onde me dirijo, apenas sou feliz no carro e durante a viagem, mas sou o mais o infeliz recém-chegado que se pode imaginar, onde quer que chegue, logo que chego sou infeliz. Sou daquelas pessoas que no fundo não suportam nenhum lugar do mundo e só são felizes entre os lugares de que partiram e para onde se dirigem. Ainda há alguns anos eu acreditava que uma tal fatalidade mórbida teria de conduzir forçosamente, dentro de pouco tempo, a uma loucura total, mas não me conduziu a essa loucura total, preservou-me efectivamente de uma tal loucura, de que tive toda a minha vida o maior pavor.
terça-feira, janeiro 20, 2009
Em Louvor das Crianças
segunda-feira, janeiro 19, 2009
sexta-feira, janeiro 16, 2009
Libertação
fecha-a suavemente,
estou aqui, e importa
ouvir o silêncio premente.
A paz pretendo atingir,
no sossego da palavra,
na ausência a surgir,
onde já não sou escrava.
Liberta-me, vou partir,
deixo-te o afecto antigo,
hoje, o desejo é sentir
o abandono do abrigo.
Quero ir, pretendo ser
alguém que dentro de mim,
reclama em aparecer,
é chegada a hora, enfim.
Deixo a porta fechada,
não há intenção de a abrir,
vou por uma qualquer estrada,
para por fim emergir.
maria eduarda
A Evolução Opaca do Ser
Ana Hatherly, in "O Mestre"
quinta-feira, janeiro 15, 2009
Coisas que se pensam quando qualquer outra coisa seria menos inútil
terça-feira, janeiro 13, 2009
Urdidura
sou mais um ponto neste tecido,
urdido paciente e vagarosamente
por quem se insinua, e me conduz
no fio da trama, que seduz.
Neste complexo ladrilho,
o tapete ganha forma, brilho.
Eventualmente,
a tecedeira ignorou certos momentos,
e, batoteira, teceu outros pontos, eventos,
numa errada carreira.
Possivelmente,
serei eu o farol que ilumina
a textura que se elimina,
o ajuste dos elementos.
Naturalmente,
o reparo consertado
afigura-se num ângulo determinado,
real desenho adaptado
à vivência das figuras
que preenchem a tapeçaria,
sem as quais eu não viveria.
maria eduarda
A Alma é Exterior
segunda-feira, janeiro 12, 2009
A Paz
A Racionalidade Irracional
sexta-feira, janeiro 09, 2009
Para escrever, para pintar, para ensinar, para curar, para criar…
Fugacidades
onde agora tu me aguardas
com quimeras de outrora,
em roupagens de agora.
Vestida a preceito,
aguardo o sinal
da alucinação passada,
mergulhada na descoberta,
vivida, inventada, reinventada...
Éramos nós o tempo, a hora,
a entrega, o furor, o sonho!
Camadas de vidas agora, de momentos,
de outras roupas vestidas,
de olhares cúmplices, espelhados,
de linhas no rosto adquiridas!
É tempo de outro tempo,
que traz à memória
o fulgor da paixão,
nas vestes de Verão,
neste Inverno da história!
maria eduarda
Invernos
quebradiços,
entoam toadas sazonais,
enchem de sonoridades
os quintais.
Rejeitam o frio
que lhes tolhe os braços,
que querem abertos
às aves matinais.
Reclamam o verde,
a cama dos pardais,
e azáfamas demais.
Mas, a luz que clareou,
por instantes breves,
entre os galhos segredou,
que o Inverno já chegou.
maria eduarda
quinta-feira, janeiro 08, 2009
Coisas que se pensam quando qualquer outra coisa seria menos inútil
foto:G.Ludovice
quarta-feira, janeiro 07, 2009
Importam-se de lhes abrir as portas da imaginação,
Do sonho na narração?
Importam-se de os deixar escrever por linhas tortas?
Não lhes peçam mais textos a metro, sem emoção…
Composições à medida, sem invenção!
João, 9 anos, e Mariana, 10 anos, levaram para casa
uma composição para fazer, um texto de 15 linhas alinhadinhas…
Ao começarem a tarefa, o João alargava a letra, naturalmente pequena,
para escrever menos… Em 5 linhas diria tudo o que sabia sobre o tema!
A Mariana, que até gostava de escrever,
e podia mesmo encher duas páginas numa composição,
inventava frases, desinteressada, só para caberem,
certinhas, nas 15 linhas…
Não escrevia com entusiasmo, mas à medida…
Escrita a metro!
Importam-se de lhes abrir as portas da imaginação,
Do sonho na narração?
Como se pode pedir que alguém escreva ideias e descrições
em linhas direitinhas, contadinhas…
Será essa a maneira de entusiasmar pela escrita???
Contem-lhes histórias, mostrem-lhes livros,
seleccionem poemas para lhes ler!…
Pode dizer-se tanto em tão poucas palavras…
Ou nada, em muitas linhas!
Dinamene
Encolher de ombros
Desalento
mas hoje doem-me os pés.
Desculpa em mim,não saí,
prisioneira da força das marés.
Na concha continuo, neste cansaço
que me inunda, me envolve.
Abraça-me como o sargaço
que não descola, não se move.
Aprisionada, envolta em braços,
não quero espreitar lá fora.
A escuridão estreita os laços,
e quero aquiescer na demora.
Há dias que acordam assim,
sem apelo, sem vontade,
como algo desprovido ou afim,
que me tira toda a sanidade.
Talvez o sol me ilumine,
se hoje a luz me presentear,
ou a pouca vontade me fulmine,
de um não querer, um apartar.
Queria poder esbracejar.
Pretendo o cansaço esquartejar.
maria eduarda
terça-feira, janeiro 06, 2009
Sobre o Tempo..
FRUTOS
segunda-feira, janeiro 05, 2009
A Memória é um Silêncio que Espera
domingo, janeiro 04, 2009
Histórias Escritas na Cara
Este livro de Isabel Zambujal é especial, para todas as idades.
sábado, janeiro 03, 2009
Infâncias
O vento não me levou,
o cavalo alado não chegou
na nuvem branca de algodão.
Não fui com as aves,
embora a porta estivesse aberta.
Escutei os sons da noite,
mas ninguém me chamou.
De mansinho fechei a porta,
e relembrei outros tempos
da meninice, em tropelia,
ao lado do companheiro de então,
atentos ao jogo das caricas, no chão.
A porta fechada passou a estar,
mas, porque o sono traz o sonho,
abri a janela de par em par!
sexta-feira, janeiro 02, 2009
TERRE DES HOMMES
On va dire tout
aux étoiles d'Exupéry.
Mais il faut se taire
devant les hommes
perdus dans le désert
de leur orgueil.
On va courir
devant les fleurs,
mais pas si
on écoute les bruits
de la guerre.
Il faut beaucoup de courage,
beaucoup d'amour,
pour parler aux hommes.
Avec les fleurs
on peut parler d'amour.
En regardant les étoiles,
on peut causer
sur la tendresse cachée au coeur pur
du Petit Prince.
On voit que,
sans retard,
le renard viendra.
N'oubliez pas les jardins,
la rose unique,
les fontaines au désert,
les champs du blé doré!
Theresa Catharina de Góes Campos Paris-France, le 8 septembre 1960.
Para seu espanto, ao olhar as lápides, todas tinham um número de anos reduzido…
José Manuel Paiva, 2 Anos,
Deolinda Silva, 7 anos,
Maria Rodrigues, 5 anos,
… 4 anos,
… 10 anos,
…3 anos…
Perante isto, o homem começou a chorar até que alguém o interpelou:
- Porque chora? Tem aqui alguém conhecido?
- O que aconteceu aqui? Que desgraça?!!! Como há tantas crianças mortas?
- Ah! É isso?!... Pois na nossa Vila temos todos um caderno, desde o momento do nosso nascimento, onde apenas são apontados os momentos felizes que vivemos e quanto duram….
As primeiras palavras, 17 minutos.
Os primeiros passos… 7 minutos.
O primeiro beijo… 1 minuto.
O nascimento do primeiro filho… 1 hora e 30 minutos.
Um livro… 2 horas.
Uma música… 15 minutos.
Um jantar especial… 3 horas.
….
E, no dia em que morremos, é feita a soma de todos os minutos e horas felizes que vivemos e inscrita na lápide.
Porque acreditamos que o que realmente importa é aquilo que de bom sentimos, partilhamos e vivemos enquanto seres humanos que somos.