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sábado, julho 11, 2009

O livro tibetano da vida e da morte

"Meditar é trazer a mente de volta a casa e isso é conseguido através da prática da tomada de consciência.

Uma vez, uma mulher idosa foi ter com Buda e perguntou-lhe como meditar. Buda disse-lhe que tomasse consciência de todos os movimentos das suas mãos quando tirava água do poço, porque sabia que se ela assim o fizesse, em breve se encontraria naquele estado de atenta e espaçosa calma, que é a meditação.

A prática da tomada de consciência, trazendo de volta a mente dispersa e, portanto, focando também os diferentes aspectos do nosso ser, é denominada "permanência calma" e leva a cabo três coisas: em primeiro lugar, todos os aspectos fragmentados de nós mesmos que estiveram em guerra uns com os outros arrumam-se, dissolvem-se e tornam-se amigos, e é essa arrumação que nós começamos a compreender um pouco melhor e por vezes, até temos relances da radiância da nossa natureza fundamental.

Em segundo lugar, a prática desarma a nossa negatividade, a agressão e as emoções turbulentas, que podem ter acumulado grande poder ao longo de muitos anos de vida. Aqui, em vez de suprimir ou saciar as emoções é importante encará-las - e aos pensamentos e tudo o mais que possa surgir - como a aceitação e generosidade tão abertas e amplas quanto possível. Os mestres tibetanos dizem que esta sábia atitude tem o sabor dos espaços infindáveis, tão calorosos e confortáveis que nos sentimos rodeados e protegidos por eles, como se estivéssemos envoltos por um cobertor de luz do sol.

Gradualmente, enquanto permanecemos abertos e atentos, e nos servimos de uma das técnicas para focar a mente, que explicarei mais adiante, a nossa negatividade irá sendo desarmada lentamente, dando lugar a um bem estar do ser ou, como dizem os franceses, être bien dans sa peau (sentir-se bem na sua própria pele). É daqui que surge a libertação, e também um profundo à vontade, e penso que esta prática é a mais eficiente forma de terapia e auto-cura.

Em terceiro lugar, esta prática põe a descoberto o bom coração essencial, uma vez que dissolve e remove a antipatia ou o mal que existe em nós, pois só assim conseguimos ser verdadeiramente úteis para os outros. Graças a esta prática e à gradual remoção do que nos possa haver de mau ou desagradável, permitimos que o nosso bom coração verdadeiro, ou seja, que a bondade fundamental que há em nós e que é a nossa verdadeira natureza, brilhe para o exterior e se torne no clima mais quente em que florescerá o nosso verdadeiro ser."

Rinpoche, Sogyal, "O Livro Tibetano da Vida e da Morte", Lisboa, Difusão Cultural, 1992

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