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domingo, setembro 14, 2008

Um voo cego a nada

Se eu nunca te disse que os teus dentes
São pérolas,
É porque são dentes.
Se eu nunca disse que os teus lábios
São corais,
É porque são lábios.
Se eu nunca disse que os teus olhos
São d'ónix, ou esmeralda, ou safira,
É porque são olhos.
Eu, se algum dia com lugares-comuns
Houvesse de louvar-te,
Decerto que buscava na poesia,
Na paisagem, na música,
Imagens transcendentes
Dos olhos e dos lábios e dos dentes.
Mas crê, sinceramente crê,
Que todas as metáforas são pouco
Para dizer o que eu vejo.
E vejo lábios, olhos, dentes.


Reinaldo Ferreira


1 comentário:

didium disse...

Poeta natural de Barcelona, filho do famoso jornalista com o mesmo nome, que nos anos 20 se celebrizou por assinar as suas peças sob o pseudónimo «Repórter X». Teve uma vida breve e pouco bafejada pela sorte. Iniciou os estudos secundários em Espanha, tendo-os concluído já em Moçambique, onde se fixou. Colaborou em algumas publicações de Maputo (a então cidade de Lourenço Marques) e da Beira: Capricórnio, Itinerário, Paralelo 20, etc. A sua poesia só ficou conhecida aquando da publicação póstuma dos seus Poemas (1960). Uma segunda edição, de 1966, vinha acompanhada de um prefácio de José Régio, que, tal como Vitorino Nemésio, lhe teceu largos elogios. A sua poesia pode ser enquadrada na tendência presencista, encontrando-se também elementos que a ligam ao simbolismo e ao decadentismo. Se nos seus poemas imperam a ironia, o niilismo e o absurdo, existe por outro lado um forte pendor humanista, visível na crítica a certos mitos.